quinta-feira, 12 de setembro de 2013

No Sport, mais do mesmo (e do pior)

O torcedor rubro-negro vem sofrendo, nos últimos 5 anos, inúmeras tentativas de redução de seu orgulho (ou arrogância), típico de qualquer torcedor do Sport digno de se identificar enquanto tal. Os nomes que podem ser responsabilizados são poucos. Três. As tentativas de redução do Sport, porém, se desdobraram para além desse número, e suas consequências se multiplicam numa progressão constante. 


É como se, depois de um grande auge (redundância aqui útil), começasse a derrocada para um abismo interminável. Quer dizer, na verdade assim é. Em 2007, o retorno a série A, título pernambucano e a permanência na série A, difícil e comemorada pelo fato de que o time perdera seu treinador, Alexandre Gallo, e seu meio de campo criativo com Vitor Junior e Fumagalli, terminando o ano com Adriano Gabiru como titular. É... Em 2008, o ápice. Título pernambucano, uma conquista de Copa do Brasil simplesmente épica (definição que transcende o fato de você, leitor, ser rubro-negro ou não), onde vários jogadores deram muito além do que tinham capacidade de dar tecnicamente e em vontade, e um destaque nacional que retornava para o Sport.  


E aí, 2009.  



Caso se deva definir um marco na história recente do Sport, esse marco é a temporada de 2009. Isso por que esse ano simboliza perfeitamente a derrocada do Leão da Ilha. Novamente, campeão pernambucano. Uma Libertadores da América pela frente, cujo o Sport só tinha participado em 1988, em decorrência de outro importante título nacional, o brasileiro de 1987. Uma bela campanha, que acabou com uma eliminação nos pênaltis contra o Palmeiras, depois de um jogo fraco da parte do Sport. 

Surge a notícia de uma briga de Paulo Baier com Nelsinho Batista, técnico e ídolo do leão. Supostamente, culmina na saída de Nelsinho do clube da praça da bandeira. Daí, queda livre. 

Começa um Brasileiro com rendimento abaixo da média, e nesse aspecto o Sport foi bem regular: jogou mal até o fim e foi rebaixado. Além do elenco fraco, o presidente Sílvio Guimarães é dado com responsável por tal acontecimento. Não sem motivos: ingerências e falta de conhecimento mínimo sobre futebol, somando-se ainda uma pirangagem gritante na hora de trazer bons reforços justificam tal estigma. 

O ano seguinte não é diferente. A falta de conhecimento mínimo sobre futebol nos dias de hoje faz com que Givanildo retorne. Técnico de valor e campeão, veja bem; porém, sem mais condições de treinar um time grande dentro desse novo futebol (fato atestado pelas suas recentes campanhas nos times onde treinou). Contratações no nível de sempre, e o resultado, idêntico: fracasso e permanência na série B, agora com Geninho. 


Em 2011, a permanência de Geninho, treinador que sempre desprezou os estaduais já foi um erro por si só. Gustavo Dubeux assume a presidência, sob promessas de levar o Sport à glórias. Nos braços da torcida (é sempre bom que se diga) e, diga-se de passagem, sem oposição (uma condição para sua candidatura que foi, no mínimo, suspeita). 



Para não ser redundante, um resumo do biênio Dubeux: fracasso no pernambucano, fracasso na Copa do Brasil, e um acesso no aborto, na acepção mais pura da palavra (falando-se em futebol, diga-se). Um alento: o antigo sonho da Arena do Sport aparentemente sairia do papel. 

No ano seguinte, os erros e fracassos já ditos se repetiram: Copa do Brasil, Pernambucano e Rebaixamento. Quando o futebol é posto de lado num clube de futebol (e que nasceu devido e para o futebol), não pode ser diferente. A arena assume o destaque e as atenções de todos. Um projeto milionário que alçaria (alçaria...) o Sport a um patamar nunca antes visto. Não falemos nisso nesse momento, entretanto. A Arena malassombro fica pra outra hora.



Luciano Bivar para o biênio 2012/2013, com o respaldo da Arena do Sport. Isso é um fato incontestável, haja vista que não se falava em mais nada durante a campanha do que a construção da dita arena. Era, antes de tudo, um retorno de um presidente que nas últimas passagens só acumulou fracassos. Mais do mesmo, ou ainda pior. Em 2001 não aguentou a pressão e renunciou a tempo de o Sport não se prejudicar mais ainda com sua presença e ingerência. Em 2005 quase conseguiu o acesso do Sport a série C, em pleno ano do centenário. 

Ficou provado por a + b que, de bola, Bivar não entende. E que com o Sport, ficaria mais claro ainda, ele pouco se importava. A arena vira desculpa para qualquer fracasso e erro. Aliás, os mesmos: eliminação na Copa do Brasil, perda de título para o Santa, e até o momento, uma campanha com um futebol que até pode garantir o acesso, mas só por que o nível do campeonato é digno de várzea.

Motivos, vários. Abandono do futebol mediante vaidades e interesses pessoais. Profissionalização às avessas: nomeia um amigo para o cargo de diretor de futebol profissional, tal como um treinador que promove um atleta da base para o time profissional e a ela dá a camisa 10 e a faixa de capitão. Junto a isso, uma redução inexplicável da folha e contratações cujo o único critério é o baixo custo e a proximidade com empresários. E como a cereja do bolo, entrevistas sem pé nem cabeça e a exposição negativa do Sport sempre que pode. Hora, revela um esquema de convocação, hora um déficit na folha do time (mesmo com receitas altas e despesas reduzidas, com dispensa de jogadores caros e contratação de jogadores e treinadores baratos; no mínimo, curioso). 

A pressão sobre Luciano Bivar é incontavelmente maior do que foi em 2001. E se não é, deve urgentemente o ser. Entretanto, um questionamento deve ser feito: por que, mesmo com tanta pressão e rejeição, ele não larga o osso? 

A resposta, todos sabem.

sexta-feira, 6 de setembro de 2013

Leônidas, por Eduardo Galeano.

Antes de Galeano, uma "breve" introdução à Leônidas.

Hoje, se estivesse vivo, Leônidas da Silva completaria 100 anos.



Começou no São Cristovão, do Rio, passando depois pelo Bonsucesso, onde também jogou basquete (!). Jogou ainda pelo Peñarol, Vasco, Botafogo, Flamengo e São Paulo, iniciando depois de aposentado dos gramados sua carreira de treinador. Durante sua carreira, foi artilheiro da copa de 1938, com oito gols, sendo um deles um golaço, contra a Polônia, de pés descalços. Foi prejudicado (assim como toda uma geração de jogadores) pela não realização das copas de 1942 e 1946, devido à Segunda Guerra Mundial. 


Autoproclamado inventor da bicicleta, talvez a finalização mais plástica do futebol, embora haja divergências quanto a isso. Chamado de "homem borracha", devido à sua flexibilidade, e de "diamante negro", por Raymond Thourmagem. 



Jogou numa época em que os negros ainda buscavam um espaço não só nacional, mas mundial. Athur Friedenreich, a bem da verdade, já lutara para tal mudança, que se deu a longo prazo (e até hoje, como em qualquer esfera social, o racismo se encontra presente, ainda que, às vezes, velado). Aliás, segundo consta no livro de Galeano, quando o Brasil foi eliminado da copa de 38, a imprensa oficial italiana, à época sobre a égide do fascismo, saudou "o triunfo da inteligências itálica contra a força bruta dos negros". Leônidas entrou nas canchas quando Friedenreich, a quem devemos o futebol plástico e alegre que hoje conhecemos, autor de 1.329 gols na sua carreira, já se retirava. 

Sem mais delongas, aí vai o texto de Eduardo Galeano, que está em seu ótimo livro Futebol ao sol e à sombra, publicado pela LP&M e que vale muito a leitura:


Leônidas 



Tinha o tamanho, a velocidade e a malícia de um mosquito. No Mundial de 38, um jornalista francês, da revista Match, contou-lhe seis pernas e opinou que ter tantas pernas era coisa de magia negra. Não sei se o jornalista francês terá percebido que, para o cúmulo, as muitas pernas de Leônidas podiam esticar-se por vários metros e se dobravam ou encolhiam de maneira diabólica. 

Leônidas da Silva entrou em campo no dia em que Arthur Friendenreich, já quarrentão, se afastou. Recebeu o cetro do velho mestre. Em pouco tempo, seu nome já era marca de cigarros e de chocolates. Recebia mais cartas que artista de cinema: as cartas lhe pediam uma foto, um autógrafo ou um emprego público. 

Leônidas fez muitos gols, que nunca contou. Alguns foram feitos do ar, os pés girando, a cabeça para baixo, de costas para o arco: foi muito hábil nas acrobacias da chilena, que os brasileiros chamas de bicicleta

Os gols de Leônidas eram tão lindos que até o goleiro vencido se levantava para felicitá-lo.

Retirado de: GALEANO, Eduardo. Futebol ao sol e à sombra. Porto Alegre: LP&M, 2012.



Caetano Bezerra

segunda-feira, 2 de setembro de 2013

Magrão.



No futebol, poucos são os nomes de contratados que são unanimidade. No Sport, isso é ainda mais típico. A desconfiança natural da torcida existe, veja bem. Entretanto, é a própria política de contratações da diretoria que se repete: apostas do sul, interior de São Paulo, e uma promessa da base do inter. Não fujamos aqui. O tema é Alessandro Beti Rosa, o Magrão. 

Naquele ano, 2005, Magrão chegava por indicação de Zé Teodoro (e vejam só como o destino nos prega peças). Assumiu a titularidade e a perdeu pra Maizena, logo depois. Maizena tinha certa moral com a torcida, se bem me lembro do tempo que ainda não era um seguidor de futebol. Pouca coisa deu certo para o Sport naquele ano, ao contrário do que deveria ser, pelo o que representava. Enfim, esses primeiros anos não foram fáceis: em 2006 voltava para a titularidade, e foi execrado pela torcida. Não sem motivos, é bom que se diga. Gustavo assumira a meta, e também não convenceu. 

O Sport sobre para a primeira divisão. 

A diretoria contrata o bonde o Santa Cruz de 2005/2006: Rosembrik, Osmar, Carlinhos Bala e Cléber, goleiro que chega com a moral de já ser titular. Novamente, decepção. Magrão inicia como titular só para depois perder a vaga para Cleber. A esperança de um goleiro que tinha dado certo no rival e que teria que dar certo aqui também. "Teria", aqui, é quase uma obrigação.  

A esperança, que a essa altura já flertava com o desespero, da torcida vira frustração e o ódio típico do torcedor do futebol. Cléber faria um feito inédito: levou dos gols olímpicos seguidos. Com a insustentabilidade dessa situação, magrão assume o gol novamente em 2007, num rodízio que a torcida desconfiava na mesma medida em que a inércia por mudança brusca reinava. 

Aí, pode-se dizer, inicia-se a virada. 



O que pode ser (como, de certo modo, foi) a danação de qualquer goleiro, foi a ascensão de Magrão. A lenda nasce da contradição. Isso por que, depois de duas ou três rodadas, não lembro ao certo, o mito Romário carregava a responsabilidade de fazer o milésimo gol. E nesse jogo, contra o Sport, o fez. De pênalti (cometido, se bem me lembro, pelo mito Du Lopes) , tal como Pelé o fez. Magrão ficou carimbado por esse gol, apesar de demonstrar não se importar com o fardo que iria, involuntariamente, carregar. Iria. Ao que parece, a imagem de Magrão foi, ao longo do tempo, dissociada desse evento e associada à virada mítica.

Magrão, tal como nós conhecemos, nasceria das cinzas. Emergiria do fundo do poço. Ou qualquer outra metáfora que você preferir. 

A partir daquela defesa, a produtividade cresce, junto com o volume de defesas impossíveis. Em 2007, foi um dos grandes nomes do Sport, num time que, no começo da competição, perdeu o treinador que montara um time competitivo, os dois meias titulares (Vitor Junior e Fumagalli), e a confiança. Magrão ajudaria àquele Sport a se livrar do rebaixamento, ao mesmo tempo que ganhava novo fôlego na ilha do retiro.  

No final daquele mesmo ano, outra lenda desembarcava na ilha do retiro, sob desconfiança inevitável da torcida. Nelsinho Batista assumiu a equipe, com o peso de um rebaixamento pelo Corinthians do qual não teve culpa. Com ele, chega Rojas, o ex-goleiro picareta que, no brasil, fingiu ser atingido por um sinalizador jogado pela torcida brasileira. E ele tornaria Magrão o mito que conhecemos. 

O ano de 2008 começou estranho: Romerito fazendo gol de todo jeito, Jefferson Madeira e Reginaldo no ataque e fazendo gol.

Prenúncio de que algo grande estava por vir. Entrando numa competição que, apesar de já ter chegado em final e semifinais, nunca venceu, o Sport conquista o Brasil. E aí que Magrão entrou definitivamente no panteão do ídolos o Sport. Defesas que eram impossíveis, até que ele as realizasse. Reflexo de um gato ou mais. Alí, junto com Romerito, Nelsinho e Durval, Magrão levantou a taça do Brasil pelo e para o Sport. De quebra, uma libertadores. 

O resto do ano foi igual: Magrão ganha destaque por suas defesas fantásticas, e por ajudar mais do que qualquer atacante o time do Sport em seus jogos no brasileirão. A ascensão se consolida, e alí ele já era lenda. 



2009 veio. Um ano de opostos: novamente Magrão se destaca na libertadores. Uma defesa antológica num chute de Lucas Barrios, no qual tirou um chute do L. Outra assinatura de Magrão na história da meta do Sport. A crueldade veio contra o palmeiras, episódio que nenhum rubro-negro digno gosta de relembrar. Portanto, essa parte será sumariamente suprimida. Na série A, tem um dos melhores desempenhos de sua história com a camisa do Sport, se não o melhor, ofuscado pelo péssimo time e, paradoxalmente, pela enorme quantidade de gols sofridos pelo time naquele ano. 

2010 vem, junto com as críticas. Como mortal que é, e como qualquer jogador, a fase excelente de Magrão passa. Continua sendo o goleiro e ídolo da torcida, porém cada vez mais contestado. 2011, apesar do acesso, e principalmente 2012 iniciam a temporada de caça à magrão. Tudo, agora, vira motivo para negativar a figura de Magrão. Magrão é passivo demais para ser capitão. Magrão sempre vai para entrevista com ar de derrotado (apesar de poucos não perceberem que ele é o único que se prontifica a ir, que tem hombridade para tal); Magrão pouco fala. Magrão é crente (sim, teve quem falasse isso). Quando não se sabe em que atirar, se atira para todos os lados, na esperança de acertar. 

Todos erraram. 

Eis que no presente ano Magrão ressurge. Novamente (perdoe a redundância útil). Tal como outrora, o time não inspira desconfiança. Tal como outrora, contestado por parte da torcida, que insiste em reparar o irreparável, amparados pela incerteza do incerto, Saulo; promissor, mais que, ainda, é apenas promissor, se torna, em parte unanimidade para a torcida que insiste em culpar o que tem menos culpa: o goleiro, tal como Galeano nos diz em seu belo livro Futebol ao sol e sombra, é herói e, em questão de segundo, vilão. 

Não nessa noite.  


Com uma iluminação concedida a poucos, Magrão vai para a meta, após o término do jogo, fazer o que todo o time não fez: dar o jogo ao Sport. 

Pega um. 

Pega dois. 

Leva o terceiro gol, como quem pretende dar requintes de crueldade, ou maior emoção à torcida. 

E pega o terceiro. 

Novamente, Magrão acontece. O que é inédito, é que depois de muito tempo ele é reconhecido por isso. Só o trabalho é premiado, e só quem tem a sina de ser uma lenda é contemplado pelos deuses do futebol. 

Costumam dizer que Magrão é um mito. Entretanto, não o é. Não é de outro planeta. É humano, e onde reside o erro da natureza humana, reside a crença de que Magrão supera qualquer condição humana. Não pelas leis da natureza ou da ciência, mas pelas leis do futebol, muito mais profundas, complexas, e sinceras.

 E está acima da condição de mito, por que tal como Perseu ou Ulisses, desafia tudo que é mítico e previamente escrito, para escrever seu próprio destino.  

Que, para a nossa sorte, é também o destino do Sport.

Caetano Bezerra